21 de agosto de 2012

A ficção científica e o cinema: Jurassic Park

Para qualquer miúdo que, no início dos anos 90, se interessasse mesmo muito por dinossauros, Jurassic Park (Steven Spielberg, 1993) estaria fadado a tornar-se num dos filmes de uma vida. No meu caso, é muito mais do que isso: foi o primeiro filme que vi em cinema, se podemos de facto considerar uma projecção ambulante na parede da Casa do Povo lá da aldeia como uma sessão de cinema. Para quem, como eu, nunca tinha ido ao cinema e nunca tinha visto um filme num ecrã maior que o da televisão que havia lá em casa, todo aquele aparato da sala escura, do projector montado em cima do palco com o tic-tic das bobinas a rodar era já, em si, fascinante; ter a oportunidade de ver, ali, uma aventura a envolver Brachiossaurus, Tyrannossaurus Rex e Velociraptors – criaturas que me ocupavam horas de leitura e releitura – foi uma experiência inesquecível, que levou Jurassic Park a conquistar um lugar muito especial nas minhas memórias de cinema, independentemente dos seus méritos enquanto filme. 

E a verdade é que Jurassic Park, adaptação cinematográfica do livro homónimo de Michael Crichton, é um filme com muito mérito. Duvido que muita gente lhe tenha ficado indiferente quando o viu na primeira metade dos anos 90. Há qualquer coisa neste filme que o torna especial, mesmo volvidos quase 20 anos. Os dinossauros robotizados continuam a parecer reais (mesmo quando sabemos que, na realidade, um Velociraptor seria pouco maior do que uma galinha)**, e o momento em que Alan Grant (Sam Neill) vê pela primeira vez o colossal Brachiosaurus será sempre mágico – como será sempre incrivelmente tenso o ataque do T-Rex aos jipes (e a perseguição), ou a caçada dos Velociraptors aos miúdos na cozinha do complexo turístico. Poucos filmes se dão ao luxo de envelhecer de forma tão elegante como Jurassic Park – e prova disso foi o insucesso das duas sequelas, incapazes de captar aquilo que tornou Jurassic Park num clássico. 

Mais do que um filme de aventura, Jurassic Park ilustra de forma particularmente hábil o tema clássico do Homem que se ambiciona a divindade ao criar vida, apenas para ver essa vida virar-se contra si. É esse o drama de Richard Hammond (interpretado por David Attenborough), um multimilionário que decide investir a sua fortuna a tentar trazer de volta à vida, através de engenharia genética, criaturas extintas há dezenas de milhões de anos, recuperando o ADN dos dinossauros através de mosquitos conservados em âmbar*. Nesse sentido, decide criar na fictícia Ilha de Nublar um parque temático, intitulado Jurassic Park (sim, todos sabemos que o T-Rex, o Triceratops e o Velociraptor são do Cretácico e não do Jurássico), e convida o Dr. Alan Grant, paleontóogo, a Dra. Ellie Sattler (Laura Dern), paleobotânica, o matemático Ian Malcolm (Jeff Goldblum) e o advogado Donald Gennaro (Martin Ferrero) para o acompanharem numa visita completa ao parque antes da abertura oficial. No entanto, um dos principais elementos da equipa técnica está envolvido num esquema de espionagem industrial que visa roubar alguns embriões, e quando desactiva os sistemas de segurança para escapar, as cercas electrificadas que mantém os dinossauros confinados são desligadas, libertando-os no parque para terror dos visitantes.

Um elenco excelente, um ritmo irrepreensível replecto de acção e um ambiente mágico - para o qual contribui a formidável banda sonora de John Williams - fazem de Jurassic Park um dos mais memoráveis filmes dos anos 90 e (mais) um marco na carreira de Steven Spielberg. As suas falhas e limitações são compensadas pelos cenários arrebatadores e por um punhado de cenas inesquecíveis (como o "incidente" de Gennaro na casa de banho, a fuga de Nedry, o aparecimento e ataque do T-Rex, entre tantos outros). É uma pena que as sequelas tenham sido tão fracas, mas isso em nada diminui o filme original, um clássico por mérito inteiramente próprio. 8/10 

*Sim, a premissa é rebuscada e, para todos os efeitos, de concretização impossível - Crichton sabia-o, e decerto Spielberg não ignorava esse facto. Discutir este ponto é mais ou menos irrelevante quando se aceita com naturalidade noutros filmes de ficção científica velocidades superiores à da luz (ou outros conceitos com resultados similares), por exemplo. 

** Entretanto, o conhecimento científico relativo aos dinossauros evoluiu imenso, e sabe-se que eles não seriam exactamente assim. Nem por isso, contudo, aqueles dinossauros deixam de parecer reais no grande ecrã.

2 comentários:

Jorge Teixeira disse...

Completamente de acordo e em plena sintonia. Jurassic Park é, indubitavelmente, um clássico e um marco na ficção científica, na minha opinião, sendo mesmo um dos meu amores de infância e um filme que definiu o meu gosto pelo cinema. Por outro lado, acaba também por definir alguns clichés do sub-género (se é que se pode chamar assim), e alguma estrutura narrativa, ainda que tendo o típico princípio, meio e fim.

Depois tem um argumento a todos os níveis construtivo, cativante e coerente. Possui ainda aquilo que eu defino como a sua grande mais valia - a banda sonora de John Williams - de resto como referes na tua crítica, aliás boa reflexão já agora.

Cumprimentos,
Jorge Teixeira
Caminho Largo

João Campos disse...

Por acaso quase me esqueci de referir a banda sonora. Só quando já estava a rever o texto é que me lembrei, e não podia deixar de mencioná-la.